5 de janeiro de 2013

Fiscais do TCE iniciam devassa em Caxias

Relatório deve ficar pronto em 45 dias e deve detalhar sumiço de bens na prefeitura, denunciado pelo ‘DIA’

Rio -  O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) iniciou nesta sexta-feira a auditoria na Prefeitura de Duque de Caxias. Técnicos solicitaram documentos ao Departamento Jurídico para apurar denúncias de irregularidades como o desaparecimento de computadores do gabinete do prefeito, kit-gás e até motor de carros públicos na troca de prefeitos, como o DIA  publicou com exclusividade na quinta-feira.
Foto: João Laet / Agência O Dia
O sumiço de kit-gás de veículos da prefeitura está na mira do Tribunal
A prefeitura tem até o próximo dia 14 para enviar ao órgão contratos, editais de licitação, inventário de bens, extratos bancários, documentos da área de Pessoal e empenhos para pagamento de empresas contratadas. A partir de então, será feita a análise da documentação e o trabalho de campo.

 




  




Documentação
A coleta de documentos e informações e a elaboração do relatório da auditoria deverão durar cerca de um mês e meio. Em seguida, o relatório será encaminhado a um dos sete conselheiros do TCE, para a elaboração do voto, que será levado ao plenário.
A partir daí, poderá responsabilizar gestores e encaminhar o resultado da apuração ao Ministério Público, para as devidas ações legais.
A equipe foi ao Gabinete de Crise montado em Xerém para formalizar a auditoria junto ao novo prefeito Alexandre Cardoso. Ele, que assumiu no dia 1º, e quarta-feira, quando chegou ao gabinete, encontrou a mesa sem computador, o telefone estava mudo e a estante vazia.

Heróis anônimos evitaram tragédia maior em Xerém

Com lanterna, gritos e batendo de porta em porta, família acorda vizinhos e salva todos

POR Felipe Freire
Rio -  Com lanternas em punho e gritos desesperados, Asuelyr dos Santos passou a madrugada de quinta-feira no terraço de casa. Ela tentava alertar vizinhos para o transbordamento repentino do Rio Capivari, em Xerém, Duque de Caxias.

Assim como centenas de anônimos de Cristóvão, Mantiqueira, Café Torrado e Ponto Final, localidades mais devastadas, a dona de casa foi uma das heroínas que salvaram inúmeras vidas com gestos simples e que continuam dividindo o pouco que restou com quem perdeu tudo na tragédia.

“Na hora, só pensava em quem estava dormindo. Meu marido e filho foram para a rua e daqui tentei acordar as pessoas com lanternas e berros. Agora, estamos todos dormindo no terraço com a vizinha da frente, já que sua casa ficou debaixo d’água”, contou Asuelyr, com o rio ainda agitado ao fundo.
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Cabeça d’água destruiu ponte dividindo o bairro Mantiqueira em duas partes | Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Para se ter uma ideia do avanço das águas, antes o Capivari ficava a 60 metros de sua residência, na Avenida Venâncio, e hoje o leito está a pouco menos de cinco metros do portão.

Mesmo com tratores e caminhões auxiliando na retirada de escombros, entulho, lixo e lama das ruas, são os mutirões que vêm fazendo a diferença em Xerém. Através da força de vizinhos e parentes, algumas pessoas vão limpando as casas, fazendo a mudança do que restou ou buscando objetos pessoais.
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
scavadeira utilizada na retirada dos escombros iça um dos automóveis arrastados pela enxurrada | Foto: Severino Silva / Agência O Dia
“Queria pelo menos a geladeira e por isso chamei vizinhos e parentes. Mas é até maluquice diante da caixa de areia em que tudo se transformou”, lamentou Tereza da Silveira, 64. “Vou para bem longe do Rio”, completou Vitória Matias, 38.

Em todo o distrito de Xerém, pelo menos 250 casas foram danificadas ou destruídas por completo, mil pessoas estão desalojadas e outras 276, desabrigadas.

Corpo reconhecido e homem sumido

O corpo encontrado na quinta-feira em Xerém foi identificado por conhecidos como de Luiz Carlos da Silva, 63 anos. Segundo a Defesa Civil de Caxias, ele é funcionário aposentado do Inmetro e estava em casa na hora chuva, à beira do Capivari.

Segundo levantamento informal, outras oito pessoas estariam desaparecidas, sendo cinco da mesma família. Mas a prefeitura trabalha apenas com o sumiço de Enéas Paes Leme, 55, funcionário da represa da Cedae que estava no alto do morro.
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Retroescavadeira utilizada na retirada dos escombros iça um dos automóveis arrastados pela enxurrada | Foto: Severino Silva / Agência O Dia
“Ele levou a janta e não voltou mais. Temos que ter fé para que ele tenha se abrigado e esteja vivo”, disse a esposa, Elizabeth Ferreira, 55. Parentes e amigos auxiliam nas buscas por Enéas, que manobrava água na represa.

Moradores ainda em área de risco

Com medo de saques e sem ter para onde ir, muitos permanecem em casas afetadas pelas águas, à beira do Capivari. “Não dormi. O pavor de enchente é grande e a todo instante pessoas gritavam que novas enxurradas vinham”, lembrou Lívia Machado, 21, que teme o futuro: “As vigas embaixo d’água balançam quando passam troncos de árvores”.

Prefeitura de Caxias recebeu e ignorou mapeamento de 98 áreas de risco

POR Constança Rezende
Rio -  A possibilidade de deslizamento de encostas em Duque de Caxias, na Baixada, já era de conhecimento da prefeitura e do governo do estado. Levantamento requisitado pelo Departamento de Recursos Minerais do Estado do Rio de Janeiro mapeou 98 áreas de risco iminente a escorregamentos e foi entregue a autoridades em abril de 2011.
Segundo o relatório, da empresa de consultoria de Geologia e Estudos Ambientais Regea, no distrito de Xerém, o mais prejudicado pelas chuvas, havia em 2011 nove áreas sob risco e cerca de 174 pessoas ameaçadas. Quarenta e cinco moradias poderiam ser afetadas.
O prefeito de Caxias, Alexandre Cardoso, disse que soube da existência do estudo quando era secretário estadual de Ciência e Tecnologia, mas que nada, na prática, foi feito em relação a ele.
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Com a enxurrada em Xerém, casas foram soterradas, e famílias perderam seus pertences: estudo de 2011 já previa perigo para muitas áreas | Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Professor de Geografia da rede pública de Caxias, André Tenreiro disse que o estudo iria ser utilizado no material escolar das aulas, mas que um funcionário, a mando do prefeito anterior, Zito, pediu que fosse mantido em sigilo.
Ainda segundo André, o tenente-coronel José Ronaldo dos Reis, comandante da Defesa Civil municipal à época, foi exonerado do cargo dois dias depois de ter disponibilizado o estudo para a Secretaria de Educação.
Reis, em seu blog, afirma que o relatório foi entregue pessoalmente ao vice-prefeito Jorge Amoreli, da gestão anterior, por representantes do Estado, em sua presença, pouco antes de sua saída do governo.
Foto: Marino Azevedo / Governo do Rio / Agência O Dia
Após o temporal desta semana, pequeno córrego virou um grande rio | Foto: Marino Azevedo / Governo do Rio / Agência O Dia
R$ 5 mil para cada família
Verba poupada na prevenção será gasta na recuperação após a tragédia. Na visita do governador Sérgio Cabral e do ministro de Integração Nacional, Fernando Bezerra, a Xerém, foi anunciado o benefício de R$ 5 mil a cada uma das 300 famílias que perderam tudo na enxurrada. O valor será usado para a compra de móveis, eletrodomésticos e utensílios.
“O estado será responsável pela recuperação das margens dos rios”, informou o prefeito Alexandre Cardozo. Os prazos para pagamentos do IPVA e ICMS serão prorrogados por seis meses nas áreas afetadas. Com o governo federal, ficará a tarefa de iniciar os trâmites para o aluguel social dos desabrigados, a dragagem e drenagem das ruas e auxílio na reconstrução de pontes.
“Vamos tirar os volumes das ruas, coletar lixo, desobstruir galerias e dar mobilidade à região. Depois vamos limpar tudo e orçar as verbas indenizatórias”, disse Cardoso.