5 de janeiro de 2013

Heróis anônimos evitaram tragédia maior em Xerém

Com lanterna, gritos e batendo de porta em porta, família acorda vizinhos e salva todos

POR Felipe Freire
Rio -  Com lanternas em punho e gritos desesperados, Asuelyr dos Santos passou a madrugada de quinta-feira no terraço de casa. Ela tentava alertar vizinhos para o transbordamento repentino do Rio Capivari, em Xerém, Duque de Caxias.

Assim como centenas de anônimos de Cristóvão, Mantiqueira, Café Torrado e Ponto Final, localidades mais devastadas, a dona de casa foi uma das heroínas que salvaram inúmeras vidas com gestos simples e que continuam dividindo o pouco que restou com quem perdeu tudo na tragédia.

“Na hora, só pensava em quem estava dormindo. Meu marido e filho foram para a rua e daqui tentei acordar as pessoas com lanternas e berros. Agora, estamos todos dormindo no terraço com a vizinha da frente, já que sua casa ficou debaixo d’água”, contou Asuelyr, com o rio ainda agitado ao fundo.
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Cabeça d’água destruiu ponte dividindo o bairro Mantiqueira em duas partes | Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Para se ter uma ideia do avanço das águas, antes o Capivari ficava a 60 metros de sua residência, na Avenida Venâncio, e hoje o leito está a pouco menos de cinco metros do portão.

Mesmo com tratores e caminhões auxiliando na retirada de escombros, entulho, lixo e lama das ruas, são os mutirões que vêm fazendo a diferença em Xerém. Através da força de vizinhos e parentes, algumas pessoas vão limpando as casas, fazendo a mudança do que restou ou buscando objetos pessoais.
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
scavadeira utilizada na retirada dos escombros iça um dos automóveis arrastados pela enxurrada | Foto: Severino Silva / Agência O Dia
“Queria pelo menos a geladeira e por isso chamei vizinhos e parentes. Mas é até maluquice diante da caixa de areia em que tudo se transformou”, lamentou Tereza da Silveira, 64. “Vou para bem longe do Rio”, completou Vitória Matias, 38.

Em todo o distrito de Xerém, pelo menos 250 casas foram danificadas ou destruídas por completo, mil pessoas estão desalojadas e outras 276, desabrigadas.

Corpo reconhecido e homem sumido

O corpo encontrado na quinta-feira em Xerém foi identificado por conhecidos como de Luiz Carlos da Silva, 63 anos. Segundo a Defesa Civil de Caxias, ele é funcionário aposentado do Inmetro e estava em casa na hora chuva, à beira do Capivari.

Segundo levantamento informal, outras oito pessoas estariam desaparecidas, sendo cinco da mesma família. Mas a prefeitura trabalha apenas com o sumiço de Enéas Paes Leme, 55, funcionário da represa da Cedae que estava no alto do morro.
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Retroescavadeira utilizada na retirada dos escombros iça um dos automóveis arrastados pela enxurrada | Foto: Severino Silva / Agência O Dia
“Ele levou a janta e não voltou mais. Temos que ter fé para que ele tenha se abrigado e esteja vivo”, disse a esposa, Elizabeth Ferreira, 55. Parentes e amigos auxiliam nas buscas por Enéas, que manobrava água na represa.

Moradores ainda em área de risco

Com medo de saques e sem ter para onde ir, muitos permanecem em casas afetadas pelas águas, à beira do Capivari. “Não dormi. O pavor de enchente é grande e a todo instante pessoas gritavam que novas enxurradas vinham”, lembrou Lívia Machado, 21, que teme o futuro: “As vigas embaixo d’água balançam quando passam troncos de árvores”.

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