9 de dezembro de 2011

De modelo a corretora de imóveis em favela:

De modelo a corretora de imóveis em favela: a trajetória de uma ex-sex symbol

Nídia de Paula, antes da era do photoshop, seduziu o Brasil com sua nudez. Hoje vive no Vidigal, no Rio

Valmir Moratelli, iG Rio de Janeiro | 09/12/2011


Foto: Selmy Yassuda
Nidia de Paula, 61 anos: ex-modelo
A síndica do edifício logo na entrada da favela do Vidigal, encravada na zona sul do Rio, atende pelo nome de Nídia de Paula. Nos anos 1970, ela foi uma das precursoras de modelos que, mais tarde, dominariam as capas de revista com a chamada nudez artística. Sem pudores, Nídia ousou e abusou de caras, bocas e olhares em diversos calendários, ensaios sensuais e filmes.

Foto: Reprodução
Capa da extinta Ele Ela: sensualidade nos anos 70
A sensualidade escancarada de Monique Evans, a beleza brejeira de Luiza Brunet, o topless carnavalesco de Luma de Oliveira no final dos anos oitenta... Nídia fez tudo isso uma década antes. Mas o tempo passou. Os cabelos longos, muitos fios brancos, marcas do tempo no rosto, fala apressada e os lábios mais finos já não condizem com as fotos amareladas de seus álbuns de recordação.
Nídia trabalha atualmente como corretora de imóveis na favela onde mora. Vendeu recentemente um apartamento de dois quartos, com garagem, por R$ 300 mil na favela. Mais um exemplo de como a pacificação está valorizando os imóveis em áreas carentes. Quando abandonou os holofotes, ela fez curso para esta nova função.
“Vou falar uma coisa que pode parecer polêmica. Mas o tráfico nunca atrapalhou minha atuação, sabia? Agora, é claro que, com a presença policial, não tem mais o barulho do baile funk que perturbava os moradores toda madrugada. A segurança também está valorizando os imóveis”, conta Nídia, que diz vender casas apenas na parte baixa do morro, onde os terrenos são legalizados. Nas horas vagas pratica dança do ventre. Já deu aulas para a atriz Maria Paula e a socialite Yara Figueiredo. “Assim que deixar a função de síndica, quero voltar a dar aulas. A dança me dá prazer”, planeja.

Foto: Selmy Yassuda
"O bom da fama é que eu era chamada pro show do Roberto Carlos, tinha mesa cativa"
Nas bancas de jornais
A moça que se mudou para o Rio ainda jovenzinha, vinda de Laje do Muriaé, norte fluminense, logo se destacou na boemia da zona sul da cidade. Frequentando o bar Veloso, reduto da turma da Jovem Guarda, ou mergulhando com as tendências da moda no Arpoador, em Ipanema. Nídia recebeu os primeiros convites de ensaios fotográficos em 1970. Foi capa da revista O Cruzeiro e garota-propaganda da Rádio Nacional, dois grandes veículos da época.

Foto: Reprodução
"A revista do Homem", anterior a Playboy. Capa de março de 1976
Propostas para posar nua vieram de imediato. Contrariando o pai, que considerava este um trabalho de prostituta, Nídia se despiu para os fotógrafos. Várias e incontáveis vezes. “Sempre recebia propostas indecentes. Uma cafetina famosa me incluiu no seu booking sem minha autorização, meu nome circulou sem eu saber. Mas jamais fiz programa, ainda que muitos falassem que foram para cama comigo”, garante a ex-modelo.
Musa da Pornochanchada
“O trote dos sádicos”, “Ainda agarro esta vizinha”, “As moças daquela hora”, “O leito da mulher amada”, “Cada um dá o que tem”. Os títulos da pornochanchada, gênero que dominou a produção cinematográfica nacional por décadas, tiveram Nídia como um dos expoentes de beleza despudorada e, em plena censura militar, ousadia comportamental. Nídia sabia, como poucas, provocar.
Com ênfase, diz que não namorou os atores com quem contracenou. Por falta de oportunidade. “Não rolou com Gracindo Junior, uma pena. Ele era um fofo. Tinha trinta, quarenta pessoas no estúdio, sem clima para isso. As pessoas veem os filmes e sempre pensam que a gente estava mesmo transando, mas não era nada disso”, afirma.

Foto: Reprodução
Prestígio internacional: capa da alemã Photo, abril de 1979
Antes dos paparazzi e do photophop
“Todo dia a imprensa inventava alguma história sobre mim, falando que eu era amante de um, noiva de outro, casada com outro. Já não tinha liberdade de ir e vir”, conta Nídia, sobre um período que, mesmo ainda sem a indústria de paparazzi, já tinha perseguição a estrelas. Nídia ficou neurótica com as inverdades a seu respeito. Diz que, da época, traz o trauma de não atender telefone fixo. Tem medo de trotes. Fez três abortos ao longo da vida, dois deles enquanto ainda era modelo. Tentou suicídio, mergulhou em remédios para dormir e emagreceu a ponto de chegar a aflitos 42 kg. “São águas passadas”, diz.
Durante a entrevista ao iG, Nídia faz questão de fazer uns passos de dança do ventre para a reportagem e levanta a blusa várias vezes para mostrar a barriga que, mesmo sexagenária, se orgulha de ter. Ela é de uma safra de modelos que não conheceu as facilidades da tecnologia digital. Suas fotos eram como na realidade: tudo ao natural. Sem silicone, sem photoshop.
O símbolo fatal que destruía lares e famílias queria sossego e, onze anos depois da primeira foto nua, em 1981, abandonou a carreira. Entre muitos amores, manteve um casamento de nove anos e dois relacionamentos. Aos 61 anos, mora sozinha.

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