''Ela tinha um problema muito sério: não tinha medo. E era linha-dura mesmo''
Tasso Marcelo/AE
"Perícia. Juíza morreu com 21 tiros, quando motoqueiros cercaram seu carro: foi a 1ª execução de magistrado no Estado do Rio"
PERFIL
Patrícia Lourival Acioli, juíza assassinada em Niterói
RIO
Conhecida
pelo rigor e por uma atuação definida como rápida e linha-dura, a juíza
Patrícia Lourival Acioli ganhou notoriedade ao condenar policiais
militares acusados de liderar grupos de extermínio e de forjar autos de
resistência (mortes em alegados confrontos) em São Gonçalo, na Região
Metropolitana do Rio.
Em setembro, ela foi responsável pela prisão
de quatro PMs acusados de integrar grupo de extermínio investigado por
11 assassinatos. Em janeiro, decretou a prisão de seis policiais do 7.º
BPM denunciados por homicídio, em casos antes registrados como autos de
resistência.
Anteontem, pouco antes de ser morta, havia
determinado a prisão preventiva de um grupo de PMs por homicídio
duplamente qualificado em decorrência de autos de resistência.
'Ela
achava que combater essas milícias e grupos de extermínio era uma
missão, que ela era uma justiceira', disse uma defensora pública. 'Ela
costumava dizer que detestava matador e PM matador era um milhão de
vezes pior.' A defensora, que pediu para não ser identificada, chegou a
representar réus julgados por Patrícia, mas as duas se tornaram amigas.
'Ela era extremamente competente e era linha dura mesmo. Em alguns
casos, era muito difícil trabalhar, porque ela dava penas altíssimas.'
Mesmo
após as ameaças, a juíza manteve o pulso firme, lembra a amiga. 'Ela
tinha um problema muito sério: não tinha medo. Eu dizia para ela trocar a
vara criminal por uma de família, mas ela acreditava que aquela era a
vida dela.'
'Áspera'. Patrícia começou a carreira como defensora
pública na Baixada Fluminense e ingressou na magistratura em dezembro de
1992. Em 1999, foi promovida a juíza da 4.ª Vara Criminal de São
Gonçalo, onde atuava havia 12 anos.
Parentes de policiais julgados
por ela criticavam sua atuação, afirmou o deputado estadual Flávio
Bolsonaro (PP-RJ), que disse ter recebido denúncias sobre a conduta de
Patrícia. 'A forma como ela conduzia as sessões era muito áspera. Ela
chamava os réus de bandidos, beirando o abuso de autoridade', disse o
deputado. 'Repudio a atitude que foi tomada contra ela, mas ela tinha
essa forma de trabalhar que criou várias inimizades.'
Bacharéis
que atuaram com Patrícia rebateram o deputado. 'Ela jamais agiu de
maneira desrespeitosa com o réu. Era educada e nunca criou nenhum
desentendimento.'
Medo. Em entrevista ao jornal O Globo, Patrícia
declarou: 'Não tenho medo de ameaça. Quem quer fazer algo vai e faz, não
fica ameaçando. Ninguém morre antes da hora. Sei que, no imaginário
popular, a juíza é quem faz tudo, mas é a polícia que investiga, são os
promotores que fazem a denúncia e é o júri que julga.'
A
reportagem, publicada em 2010, recebeu o título Uma Juíza Linha-dura no
Caminho dos PMs. Apesar de ter declarado não temer ameaças, não permitiu
que seu rosto fosse fotografado para preservar a família. Patrícia era a
única a julgar homicídios em São Gonçalo. O Tribunal de Justiça disse
que três juízes vão atuar na 4.ª Vara Criminal.
Patrícia tinha 47 anos, três filhos e namorava o policial Marcelo Poubel.
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