14 de janeiro de 2011

Repórter do Extra relata situação caótica em Nova Friburgo

Município de Nova Friburgo foi o mais atingido pelas fortes chuvas / Crédito: Aline Couto
Aline Couto
Seis horas de viagem. Normalmente, eu teria feito em duas. Um mar de lama e lixo, pessoas desorientadas pelas ruas. Parecia uma cena de filme, ou aqueles desastres que a gente vê pela TV, tão distantes. Mas dessa vez era ali, era comigo. E doeu demais.
Na entrada da cidade já se começava a ter dimensão do que a fúria da natureza havia feito. Crateras se abriram no chão. Árvores e terra vieram abaixo. Quando finalmente consigo entrar na minha querida terra natal, o que encontro é desolador. Pontes quebraram ao meio como se fossem as coisas mais frágeis do mundo. Muros se romperam. Terra e água por todos os lados. O rio que invadiu as casas. Chuva. E mortos, muito mortos.
Nos dezenove anos que eu vivi em Friburgo nunca tinha visto nada com as dimensões do que eu vi hoje. Minha cidadezinha já foi muitas vezes arrasada por chuvas e enchentes. Tenho lembranças de colegas de escola que perderam tudo em tragédias como as de 1996 e a de 2007. Mas nunca vi tanta gente perder tanta coisa. Nunca vi a minha Nova Friburgo no estado em que ela está.
Ao passar pelo Centro só se encontra barro e sujeira trazidos pela água. Ruas de asfalto parecem chão de terra batida. Pessoas vagam em meio à lama perdidas, como se esperassem alguma orientação. Até mesmo divina. Uma cena absurda. Um carro, levado pela correnteza, ficou preso às grades de um prédio.
A igreja em que meus pais se casaram, na Praça do Suspiro, há 37 anos, está acabada. O Instituto de Educação, que já formou tantas professoras no município, virou um necrotério. A população se aglomera na porta da escola em busca da lista com os nomes das vítimas fatais e dos desabrigados, enviados para outro colégio.
A população, em polvorosa, lota os postos de combustíveis e foge. Há filas de 50, 60 carros, aguardando para abastecer. O tráfego se intensifica e fica muito complicado. Eu sigo o meu caminho. Preciso de notícias dos meus pais, com quem não consigo contato há dois dias.
Na chegada ao meu bairro, mais lama e lixo. A escola em que eu estudei arrasada pela água. Árvores invadiram o pátio e o muro estourou com a força da correnteza. A obra de contenção, feita em alguns pontos do Rio Bengala, simplesmente sucumbiu à natureza. A terra cedeu e até uma das máquinas usadas na empreitada ficou pendurada pelas rodas.
Finalmente chego na minha rua e a encontro quase que totalmente fechada. Sou recebida por uma vizinha, que me conta que seis casas vieram abaixo. Felizmente, todos saíram de lá com ferimentos leves, mas perderam carros e motos. Uma barbearia funcionava no primeiro andar, junto a um bar. Deles nada se reconhece. Tudo é entulho.
Cruzo o caminho e encontro meus pais. Graças a Deus! Bem, com saúde e com notícias dos outros parentes próximos. Os alerto sobre a previsão de novas chuvas para a região e decidimos que eles vêm para casa comigo. Malas feitas, pé na estrada.
Deixo Friburgo com lágrimas nos olhos. A cidade que me viu crescer hoje está reduzida a um amontoado de coisas, memórias e tristeza. Meu alívio é saber que muitos moradores estão na frente de batalha, ajudando a sinalizar o trânsito, caótico, ou auxiliando no resgate das vítimas e dos desabrigados. Espero que dessa vez o governo finalmente olhe pela minha pequena e amada terra.

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